Artur logo percebeu que dividir um apartamento com Samuel — o cara que, na adolescência, fazia questão de bancar o valentão com ele — seria uma péssima ideia.
Tinha de fazer tudo: limpar, lavar e cozinhar, sempre sob a ameaça do colega, maior e mais forte do que ele. Mas, como não conseguia pagar o aluguel sozinho, acabava se submetendo.
Certo dia, entrou por curiosidade na barraca de uma cigana. Lá, a mulher o olhou nos olhos e descreveu exatamente o que acontecia em sua vida, como se o conhecesse melhor do que qualquer outra pessoa.
— Menino — disse ela — por que não resolve isso? Por que não dá um basta?
— Eu já tentei. Mas Samuel, para me castigar, puxou minha cueca até a nuca, como fazia na época do colégio. Não sou páreo para ele.
— Entendo... Bem, vou lhe dar uma poção que pode tornar as coisas mais fáceis. Tome este frasco. Coloque duas gotas — lembre-se, não mais do que duas! — na bebida do seu colega. Com isso, ele vai se tornar mais dócil, menos machão, e você poderá lidar melhor com ele.
Artur agradeceu, pagou a mulher e voltou para casa. Ao chegar, encontrou tudo uma bagunça. Samuel havia chamado os amigos para ver o futebol, e havia garrafas e restos de comida espalhados pela sala.
— Ainda bem que chegou. Me traz uma cerveja, e amanhã bem cedo eu quero essa bagunça limpa, entendeu?
— S-sim, Samuel...
Artur foi para a cozinha furioso. Queria matar o colega. Mas então se lembrou da poção. Colocou duas gotas na bebida, mas, ao pensar melhor, despejou o frasco inteiro. Queria ter certeza de que, se aquilo fosse mesmo de verdade, funcionaria para valer.
Na manhã seguinte, Artur acordou cedo, mas, ao entrar na sala, viu tudo limpo e arrumado. Sentiu cheiro de comida e foi até a cozinha. Lá, deu de cara com uma mulher.
— Ei, quem é v... S-Samuel?!
— Bom dia, Artur! Sente-se, pois já vou servir o seu café da manhã. Pode me fazer um favor, querido? Não gosto mais do nome Samuel. Me chame de Samanta, ok?
— Samuel... quer dizer, Samanta... olha, eu fiz algo com você. Fui até uma cigana e... precisamos procurar ajuda...
— Ajuda? Acha que eu não dou conta? Artur, eu já limpei a casa, e depois do café vou dar um jeito na cozinha e cuidar da sua roupa.
— Como assim? Não vai trabalhar?
— Não. Pensei bem e não quero mais ser gerente de loja de autopeças. Lidar com aqueles homens brutos não tem mais nada a ver comigo. Prefiro ficar em casa e cuidar das coisas por aqui.
— Mas e o aluguel? Eu não posso pagar sozinho.
— Já pensei nisso! Vou fazer bolos e salgados para festas aqui em casa. Com o lucro, ajudo a pagar o aluguel e ainda sobra. Você deixa eu fazer isso, Arturzinho? Por favor...
— Bem, Samu... digo, Samanta, se você quer mesmo isso, tudo bem.
— Ai, obrigada! Você ia falar algo sobre uma cigana?
— Não era nada... Agora, me sirva o café, Samanta.
— Sim, senhor!
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